Pondo fim a uma discussão que se arrasta com maior intensidade desde 2010, o STF decidiu, em 8/3/2022, pela constitucionalidade da penhora do bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, seja ela residencial ou comercial. Trata-se do Tema 1.127, julgado em sessão plenária e em regime de repercussão geral. Assim, o imóvel do fiador do contrato de locação comercial responderá pelas dívidas locatícias do locatário, tal como já ocorria nos contratos de locação residencial.
Por sete votos a quatro, o plenário entendeu que a Lei nº 8.009/1990, que dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família, ao estabelecer em seu artigo 3º, inciso VII a exceção à regra da impenhorabilidade para o imóvel de fiador do contrato de locação, não distingue a modalidade de locação abarcada pela exceção, abrangendo tanto a locação residencial quanto à locação comercial, pois, “se a intenção do legislador fosse a de restringir a possibilidade de penhora do imóvel do fiador ao contrato de locação residencial, teria feito expressamente essa ressalva”.
Além disso, o voto condutor pondera que o ato de disposição do imóvel nesse caso é voluntário, ou seja, o fiador abre mão da impenhorabilidade de seu bem de família de forma espontânea, conferindo a possibilidade de constrição do imóvel em razão da dívida do locatário, situação esta que não se diferencia qualquer que seja a modalidade de locação.
O voto do Ministro Relator Alexandre de Moraes, admitindo a penhora do imóvel do fiador de contratos de locação comercial, foi acompanhado pelos Ministros Luís Roberto Barroso, Nunes Marques, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, André Mendonça e Luiz Fux. Em sentido contrário, votaram os ministros Ricardo Lewandowski, Rosa Weber e Cármen Lúcia, defendendo que o direito de moradia e à dignidade da pessoa humana se sobreporia à voluntariedade do ato do fiador e não estaria abarcado pela exceção do artigo 3º, inciso VII da Lei.
Em 2010, o próprio STF havia fixado a tese de que seria constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação (Tema 295). Porém, como a referida tese também não especificava a modalidade locatícia por ela abarcada, novas divergências se sucederam inclusive dentro da Suprema Corte, destacando-se a decisão proferida em 2018 pela 1ª Turma do STF, nos autos do Recurso Extraordinário nº 605.709 que inadmitiu a penhora do único bem de família do fiador de locação comercial.
Agora, a tese fixada pela nova decisão do STF é expressa ao estabelecer que a exceção à impenhorabilidade é válida para ambas as modalidades de locação (residencial e comercial). Vejamos como foi redigida a tese fixada: “É constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, seja residencial, seja comercial”. O efeito da decisão, por sua vez, é vinculante para o judiciário.
Com o julgamento da questão, os mais de 320 (trezentos e vinte) processos então suspensos pela afetação do tema e que aguardavam a decisão do STF, retomarão seu curso conforme o estado em que se encontram e os Tribunais Estaduais haverão de adotar o entendimento pacificado pela Suprema Corte, podendo inclusive exercer juízo de retratação caso já tenha sido proferida decisão em sentido contrário.
Desta forma, é esperado que, a partir de agora, sobrevenham inúmeras decisões admitindo a efetivação e/ou determinando o prosseguimento de penhora sobre imóveis de fiadores de locação comercial, mesmo que o referido imóvel seja um bem de família, assim entendido como sendo o único imóvel próprio da pessoa ou da entidade familiar, nos termos do artigo 1º da Lei nº 8.009/1990.
Texto de autoria de Thiago Campos, nosso Coordenador do Setor Consultivo.
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