A contribuição para o salário educação – FNDE, no percentual de 2,5% incidente sobre a folha de salário, é devida pelas empresas e não pode ser cobrado das pessoas físicas, conforme disciplina o art. 212 § 5º da CF, e o art. 15 da Lei nº 9.424/96, regulamentada pelo Decreto 3.142/99, alterado pelo Decreto nº 6.003/2006.

Entretanto, a Receita Federal vem exigindo dos produtores rurais pessoas físicas e dos consórcios de produtores rurais, indevidamente, com base no Anexo IV da IN 971/2009, atualmente alterada pela IN nº 2110 de 2022, publicada em 19 de outubro, cuja obrigação encontra-se no anexo V.

Tal exigência é abusiva e em desconformidade com a legislação que disciplina tal exigência,  extrapola seu limite regulamentador ao criar hipótese de incidência não prevista em lei.

Isto porque, o produtor rural pessoa física que não possui registro na junta comercial e com ou sem cadastro no CNPJ não se enquadra no conceito de empresa, motivo pelo qual não pode ser compelido a arcar com a contribuição para o salário educação, bem como, o consórcio simplificado de produtores rurais.

Inclusive,  com relação ao produtor rural pessoa física sem registro no CNPJ, o Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou pela sua não incidência, nos termos do Resp 1743901/SP. O mesmo ocorre para os produtores rurais pessoas físicas organizadas em consórcio simplificado de produtores rurais, que são equiparados às pessoas físicas, conforme dispõe a IN nº 2110/22, artigo 146, XIX, “b”.

O cadastro no CNPJ dos consórcios simplificados de produtores rurais não descaracteriza a sua condição de pessoa física para fins de incidência do FNDE, nos termos do art. 25-A da Lei 8212/91. O cadastro é mera formalidade imposta pela Secretaria da Receita Federal desde 2011 aos consórcios simplificados de produtores rurais, em decorrência da IN nº 1.210/11, que deu nova redação à IN nº 1.183/2011, atualmente tal exigência se verifica no art. 4º, iV da IN nº 1863/18.

Essa obrigatoriedade do cadastro no CNPJ também se vê no estado de São Paulo, para os produtores rurais pessoas físicas, nos termos da Portaria CAT n° 117/10 da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo.

Em ambas as situações, se verifica a inscrição no cadastro do CNPJ como obrigatoriedade para fins fiscais, o que não tem o condão de desconstituir a natureza de empregador rural pessoa física.

Ou seja, mesmo com o cadastro no CNPJ, o produtor rural não perde a condição de pessoa física, ficam inscritos no código de natureza jurídica 408-1, que se refere à forma de contribuinte individual.

Nesse sentido, também segue a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da Primeira Região: AC | 0048001-79.2013.4.01.3400, da Terceira Região: APELAÇÃO CÍVEL - 1775399 0000765- 64.2010.4.03.6122 e, da Quarta Região: APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000720-04.2013.404.7104/RS.

Inclusive, recentemente, em março de 2021, o Ministro Francisco Falcão tratou do assunto em decisão monocrática nos autos do Resp nº 1813407/RS, mantendo a decisão recorrida para reconhecer que não se caracteriza atividade empresarial o consórcio simplificado de produtores rurais resultante da união dos produtores rurais que o compõem, pois esta reunião não implica na perda da individualidade dos consorciados.

Veja-se que o STJ afastou a contribuição do salário educação exatamente sob o argumento de que não é o CNPJ que caracteriza a empresa, a exigência do CNPJ é uma imposição de caráter meramente burocrático, no caso do consórcio de produtores rurais tal exigência ocorre em decorrência da IN nº 1.210/11 e, no estado de São Paulo, para os produtores pessoas físicas, na Portaria CAT n° 117/10.

Ou seja, o simples fato do produtor rural possuir inscrição no CNPJ não tem o condão de caracterizá-lo como empresário, trata-se apenas de uma formalidade exigida para fins de fiscalização. Inclusive, a indicação do produtor rural como contribuinte individual é um reforço nessa direção.

O Superior Tribunal de Justiça também reforça o entendimento de que o produtor rural pessoa física não se enquadrar na condição de empresa. A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento aos embargos de declaração opostos pelo Banco do Brasil, em face do acórdão proferido no Recurso Especial nº 1.800.032-MT, manteve o entendimento de possibilidade de recuperação judicial de produtor rural, englobando o período em que o produtor não tinha registro na Junta Comercial.

Inclusive, o produtor rural não é empresário sujeito a registro, a inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis é facultativa, nos termos do art. 971 do Código Civil.

Assim, tanto os produtores rurais pessoas físicas sem registro no CNPJ quanto com registro no CNPJ, inclusive o consórcio de produtores rurais pessoas físicas, não estão obrigados ao recolhimento da contribuição para o salário educação - FNDE.

Para aqueles produtores que ainda fazem o recolhimento dessa contribuição, por exigência indevida da Secretaria da Receita Federal presente no Anexo IV da IN 971/2009, atual Anexo V da IN 2110 de 2022, aconselho a imediata providência judicial para afastar tal exigência e garantir o direito ao não recolhimento futuro, bem como a restituição/ressarcimento dos recolhimentos realizados nos últimos 5 (cinco) anos com as devidas correções.


Fernanda Teodoro Arantes
fernandaarantes@mandaliti.com.br