Ao julgar o Recurso Especial nº 1.775.269, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que é necessária a instauração do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (IDPJ), previsto no artigo 133 do Código de Processo Civil (CPC), quando há o redirecionamento da Execução Fiscal à pessoa jurídica que integra o mesmo grupo econômico da sociedade originalmente executada, mas que não foi identificada no ato de lançamento ou que não se enquadra nas hipóteses dos artigos 134 e 135 do Código Tributário Nacional (CTN).
O incidente de desconsideração da personalidade jurídica, disciplinado pelos arts. 133 a 137 do CPC, permite, incidentalmente ao processo, desconsiderar a personalidade jurídica da empresa executada e, desse modo, conseguir responsabilizar pessoalmente o integrante da pessoa jurídica (sócio ou administrador) nos casos em que a lei material o autoriza.
Como o CTN não regula a responsabilidade tributária dos grupos econômicos na hipótese de ilícitos, deve-se aplicar, subsidiariamente, o Código Civil (CC) a esses casos.
Assim, de acordo com o art. 50 do CC, a desconsideração da personalidade jurídica pode ser aplicada se houver abuso da personalidade, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial.
O desvio de finalidade ocorre quando a pessoa jurídica for indevidamente utilizada para fins diversos dos previstos no ato constitutivo, dos quais se a deliberada aplicação da sociedade em finalidade irregular e danosa, provocando necessariamente lesão a direito de terceiros. Como os grupos econômicos não são pessoas físicas, as infrações tributárias por eles praticadas não estão tipificadas no artigo 135 do CTN, não havendo norma específica para o caso.
Já a confusão patrimonial consiste na impossibilidade de fixação de limite entre os patrimônios da pessoa jurídica e o dos sócios e acionistas, tamanha a mistura que se estabelece entre ambos. Resta configurada, por exemplo, quando a sociedade paga dívida do sócio e quando há bens também de sócio registrados em nome da sociedade e vice-versa, não havendo suficiente distinção, no plano patrimonial, entre as pessoas.
Assim, de acordo com o Ministro Gurgel de Faria, relator do referido REsp, “sem a indicação da pessoa jurídica no ato de lançamento, ou sendo inexistentes as hipóteses dos artigos 134 e 135 do CTN, a imputação da responsabilidade ao grupo econômico ou à pessoa jurídica dele integrante dependerá da desconsideração da personalidade jurídica, cujo reconhecimento somente pode ser obtido com a instauração do referido incidente”.
Dessa maneira, ao decidir aplicar o IDPJ ao caso em análise, o relator explicou que “o redirecionamento de execução fiscal à pessoa jurídica que integra o mesmo grupo econômico da sociedade empresária originalmente executada, mas que não foi identificada no ato de lançamento (nome na CDA) ou que não se enquadra nas hipóteses dos artigos 134 e 135 do CTN, depende da comprovação do abuso de personalidade, caracterizado pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial, tal como consta do artigo 50 do Código Civil – daí porque, nessa hipótese, é obrigatória a instauração do incidente de desconsideração da personalidade da pessoa jurídica devedora”. (grifos nossos)
No caso concreto, ao dar provimento ao REsp, o STJ determinou o retorno dos autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região para que ordene a instauração do IDPJ antes de decidir a pretensão atinente ao redirecionamento da Execução Fiscal.
Patricia Bove Gomes
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